Yoga como terapia para esclerose múltipla

Yoga como terapia para esclerose múltipla

O decorrer da vida faz com que nos cruzemos com pessoas muito diversas e fantásticas! As práticas de yoga não são exceção, pelo contrário, acabam por ser redutos onde se cria empatia e intimidade, onde nos deparamos com as pessoas sem papéis sociais, sem camadas protetoras e onde a sua verdadeira e boa essência é fácil de sintonizar.

Este texto é uma homenagem a uma Mulher sem nome, nem lugar, mas com uma força anímica sem par. Portadora de uma doença neurológica, progressiva e crónica, ela é o rosto da gratidão pelo bom que tem na vida; é jovem e olha para o futuro com esperança e muito amor, tem fé e anseia ser mãe. Que mãe mais linda tenho a certeza de que virá a ser, nas palavras dela e aos nossos olhos o amor transborda e ela tem muito para dar. É um prazer quando está presente nas aulas e rarissimamente falha, ela adora yoga, relata o bem que lhe faz, conta os dias da semana para praticar e, quando o dia chega, segreda-nos que é o melhor momento da série de dias que passaram.

São aulas alegres, com muita partilha, há lugar a profunda emoção, a um abraço envolvente e a brilho nos olhares diretos.

Ela é verdadeiramente um exemplo para nós.

A esclerose múltipla é uma doença autoimune, inflamatória e degenerativa que afeta o sistema nervoso central através do próprio sistema imunitário e são diversos os efeitos que se podem manifestar, dentre os quais: fadiga e perda de massa e força muscular, alteração na coordenação, no equilíbrio físico e na marcha, dor, falhas de memória e concentração, incontinência urinária, ansiedade, depressão, alterações na visão.

As pessoas a quem esta patologia foi diagnosticada sabem que devem tomar a medicação recomendada e que o exercício físico é aconselhável durante toda a vida. Os que tiveram a sorte de experimentar o yoga, diria que não mais o vão deixar pois reconhecem que as várias técnicas como os exercícios respiratórios, a meditação, as posturas físicas e o relaxamento as vão ajudar.

O yoga é uma excelente terapia e traz efeitos benéficos:

  • melhora a circulação;
  • melhora a coordenação e o equilíbrio;
  • melhora a concentração;
  • melhora o desconforto nos olhos e a visão;
  • melhora o controlo da bexiga;
  • aumenta a consciência corporal e o tónus muscular;
  • aumenta a capacidade cognitiva;
  • diminui a ansiedade e sentimentos como intolerância e raiva;
  • diminui a fadiga e a dor;
  • relaxa.

Tendo em conta os condicionalismos da doença, os benefícios do yoga e não pretendendo ser exaustiva, descreverei algumas técnicas simples que certamente vão melhorar o estado de todos nós em geral e dos que sofrem de E.M. em particular.

Exercícios de controlo e expansão da respiração:

  • Qualquer respiração tranquila, longa e consciente acalma a mente e o corpo. Apenas observar como respiramos, se de modo acelerado ou calmo, avaliar a sua temperatura, sentir o ar a entrar e a sair das narinas, só essa atenção atribuída à respiração permite centrarmo-nos mais em nós, diminuir os estímulos sensoriais à nossa volta bem como os níveis de stress.
  • Podemos também inspirar profundamente como se cheirássemos longamente uma flor e expirar gradual e lentamente pela boca como se quiséssemos apagar uma vela bem ao longe.
  • A respiração da abelha (Bhrāmārī prāṇāyāma) é ótima pois é feita com som e este tranquiliza. Podemos praticá-la com uma mão no peito para sentir a vibração, fechar os olhos, colocar a outra mão a tapar ao de leve um dos ouvidos, inspirar e expirar pelo nariz fazendo um som ao expirar como o zumbido de uma abelha. A face e as mandíbulas estão relaxadas e nós aquietamos, concentrando-nos no som no interior do crânio.
  • A respiração com a língua entre os dentes (Śhītkari prāṇāyāma) arrefece o palato mole e o sistema nervoso central, proporciona uma sensação refrescante na língua, arrefece o corpo e acalma a mente, afeta centros cerebrais importantes associados a pontos biológicos e à regulação da temperatura. Reduz a excitação mental e emocional, leva ao relaxamento muscular e reduz a tensão arterial. Inspiramos com a ponta da língua encostada aos dentes incisivos superiores, com a boca entreaberta, fechamos a boca e expiramos pelo nariz.

Posturas físicas:

  • Sentados de pernas cruzadas ou esticadas, fazemos rotações suaves com a coluna vertebral, deixando os ombros movimentarem-se livremente e a bacia ficar relaxada, fazemos círculos à volta do cóccix, inspirando para a frente e expirando para trás.
  • Sentados, fazemos uma torção suave do tronco. Mão direita no joelho esquerdo e o braço esquerdo ergue, bem alongado. Olhar a mão em cima. Inspirar e abrir bem a caixa torácica. Trocar depois.
  • Sentados, as pontas dos dedos tocam nos ombros e os cotovelos estão unidos à frente. Rodar o cotovelo direito para cima e o esquerdo para baixo. Fazer vários círculos em direções opostas e voltar a unir à frente. Permite trabalhar os dois hemisférios do cérebro e é excelente para a concentração.
  • Na posição de quatro apoios (joelhos e mãos no chão), inspirar e alongar a perna direita atrás e o braço esquerdo à frente, expirar e trazer o joelho direito e o cotovelo esquerdo a unirem-se no centro do corpo. Se for demais, fazer apenas com a perna ou só com o braço. Parar e relaxar a tensão nos ombros e na bacia. Repetir para o outro lado.
  • Em pé, pernas afastadas à largura da bacia, sentir os pés bem enraizados no chão, erguer os braços perpendiculares ao tronco, alinhados com os ombros e rodar o tronco para a direita deixando que também o pé rode. Rodar depois o tronco para a esquerda, deixando que o pé saia do chão e rode. É um trabalho de mobilização da coluna vertebral. Mover todo o corpo (pés, pernas, bacia, coluna, braços, cabeça) num movimento fluído. Não colar os pés ao chão nem fazer com as pernas rígidas, pois é natural que possa provocar dor na zona lombar e a ideia é aliviar as dores nas costas.
  • Em pé, deslocamos o peso do corpo para a ponta do dedo grande do pé e depois para o calcanhar, repetimos algumas vezes. Rodamos depois um pé no chão, apoiando o calcanhar, depois o dedo grande até ao dedo pequenino do pé, novamente o calcanhar, o dedo grande, o dedo pequenino, rodando sempre o pé. Isto contribui para ativar os propriocetores do pé aumentando e trabalhando a estabilidade e o equilíbrio e permitindo uma boa perceção da posição, do peso e da distribuição corporal. Fazer o mesmo com o outro pé. Parar e sentir o enraizamento à terra.
  • Em pé, agarrado ou não a algo, inspiramos e ficamos na ponta dos dedos dos pés, expiramos e baixamos, assentando os calcanhares e tirando os dedos dos pés do chão.
  • Inspirar e abrir os braços, expirar e abraçarmo-nos com mão direita no ombro esquerdo e a mão esquerda no ombro direito. Apertar bem. Inspirar e subir os braços nessa posição, alinhando-os com o queixo, expirar e baixá-los encaracolando a coluna e a cabeça. Desfazer. Isso vai permitir ganhar espaço entre as omoplatas. Libertar depois os braços em movimentos soltos.
  • Deitado em decúbito dorsal, pernas fletidas e afastadas à largura da bacia, planta dos pés no chão. Inspirar e esticar os braços atrás da cabeça erguendo as nádegas e as costas do chão. Expirar e baixar os braços à frente enquanto as costas descem e as nádegas voltam ao chão, lentamente. O cóccix nem precisa de tocar no chão. Repetir.

Contrações musculares (bandhas):

  • São essenciais para evitar a incontinência urinária e para tonificar os músculos da zona pélvica e as conexões neuronais no abdómen. Contraímos a musculatura do pavimento pélvico, inspiramos profundamente e, após a expiração lenta, libertamos a contração e relaxamos a pélvis e o abdómen. Fazer vários ciclos.

Exercícios com os olhos (trātaka):

  • Sentados confortavelmente, com a coluna direita e as mãos apoiadas nos joelhos, abrir muito os olhos, amplamente, e dirigir o olhar para as doze horas, fechá-los depois contraindo muito. Voltar a abrir e dirigir o olhar para a uma hora e fechá-los com força e assim ir percorrendo o relógio imaginário. Este exercício vai humedecer os olhos, melhorando a questão da secura na vista.
  • Sem mexer as sobrancelhas nem a cabeça, rodar o olhar fazendo um círculo total numa direção e depois na outra. No final esfregar bem as mãos uma na outra e com elas em concha deixar a cabeça baixar e poisar nas palmas das mãos sentindo o pescoço solto e a cabeça pesada. Com a ajuda das mãos, trazer a cabeça para a sua posição usual.

Relaxamento final:

  • Deitados no chão, soltando, deixando ser como é, entregando o corpo ao chão, sentindo a gravidade e o peso do corpo, encontrando a nossa respiração calma e longa, correta para nós próprios. Aprender a soltar a tensão nos ombros, no ponto entre as sobrancelhas, percorrendo mentalmente e relaxando todo o corpo. Descontrair bem como se derretêssemos no chão. Enraizar, deixar a resistência, permitir que essa calma nos serene e refresque.

Meditação:

  • Confortavelmente sentados refletimos e trabalhamos, por exemplo, a belíssima ética do yoga: a aceitação, a compaixão, o contentamento, a não-violência, o não julgamento, o conhecimento de si próprio, a entrega à vida, entre outros. A meditação permite serenar a mente, reduzir a angústia e a frustração, aumentar a concentração.

Advertências: Não praticar quando o ritmo cardíaco está muito acelerado, quando se sente muito cansado ou ofegante ou a transpirar muito. O aquecimento corporal é prejudicial e pode provocar surtos da doença.

Conselhos:

  • Aprender a regular a temperatura do corpo e praticar yoga de forma calma e controlada;
  • Nunca desistir de viver feliz com o que temos de bom, ou seja, valorizar os aspetos positivos da vida;
  • Rir durante a prática, não ser exageradamente rígido e sério;
  • Ter consciência de que a E.M. pode não ter cura hoje, mas tem controlo e podemos minorar os seus sintomas e atrasar a sua evolução;
  • E sobretudo deixarmo-nos inspirar por pessoas como essa Mulher sem nome, nem lugar e, como ela, sabermos olhar em frente, caminhar com coragem e fé, procurando com dignidade o melhor para nós, vivendo em amor e sabendo detetar e usar a alegria de viver.